Celulando

15.7.06

Câncer em plantas?

Colunista mostra como surgem os tecidos tumorais em vegetais, também chamados de galhas

(fonte: http://cienciahoje.uol.com.br/53070)



Aposto que você nunca ouviu falar em câncer em plantas. Mas o surgimento de tumores é um evento que acomete quase todos os organismos multicelulares conhecidos, inclusive os vegetais.

Os tumores em vegetais, também chamados de galhas, podem assumir formatos variados e afetar diferentes tecidos das plantas. A foto da esquerda mostra uma galha na raiz de uma planta; a da direita, em uma folha da espécie Andricus quercuscalicis (fotos: Wikipedia).

Os tecidos tumorais em plantas, conhecidos como galhas, são causados pela ação de diversos organismos como bactérias, fungos, nematóides, insetos e ácaros. Esses parasitas penetram nos vegetais, sobrepujam suas defesas mecânicas e químicas e liberam compostos que estimulam células-tronco totipotentes localizadas nas regiões de crescimento das plantas – os meristemas – a proliferar e se diferenciar.

Sinais químicos produzidos pelos galhadores fazem com que nutrientes sejam drenados das outras partes das plantas para que sejam utilizados para sua alimentação. Há evidências de que os galhadores podem também aumentar a fotossíntese nos meristemas para ter mais alimento disponível.

São conhecidas mais de 13.000 espécies de insetos que induzem a formação de galhas. Através da liberação de compostos químicos produzidos por esses organismos durante a deposição de seus ovos ou pelas larvas em desenvolvimento, as plantas afetadas são induzidas a gerar tecidos não encontrados nos indivíduos não galhados (neoplasia), incluindo estruturas complexas formadas por pêlos, espinhos e por células produtoras de néctar e resina.

Agrobacterium
Os mecanismos de indução de galhas são melhor compreendidos em bactérias Agrobacterium tumefaciens. Esses parasitas são atraídos por açucares e compostos fenólicos perdidos pelo vegetal em danos na sua superfície, como a acetosiringona.

A Agrobacterium é capaz de transferir informações genéticas presentes em pequenas seqüências circulares de seu DNA conhecidas como plasmídeos para os cromossomos das células do vegetal. Estes plasmídeos possuem genes que comandam a produção dos hormônios vegetais como auxina e citoquinina. A produção desses compostos causa um desequilíbrio nos níveis hormonais nas células meristemáticas vegetais que, assim, deixam de ter sua multiplicação controlada pela planta e desenvolvem-se como um tumor. Os níveis desses hormônios também determinam a morfologia da galha a ser formada.

A foto mostra bactérias Agrobacterium tumefaciens aderindo a células vegetais. Essa bactéria é um dos organismos que induzem a formação de galhas mais estudados pela ciência (foto: Martha Hawes, Universidade do Arizona).

As Agrobacterium são promíscuas quanto às suas preferências e são capazes de infectar membros de quase todos os grupos vegetais, com exceção dos musgos (briófitas) e samambaias (pteridófitas). Essa característica, aliada à sua eficiência para exportar seus plasmídeos para células hospedeiras, fizeram com que a Agrobacterium passasse a ser utilizada pelos cientistas para transferir genes para vegetais, dando origem às afamadas e questionadas plantas transgênicas. Diversos genes, como aqueles que produzem toxinas para eliminar insetos ou que conferem resistência a herbicidas, podem ser inseridos no genoma de vegetais utilizando-se essa bactéria como vetor.

Surpreendentemente, descobertas recentes indicam que a Agrobacterium pode transferir material genético para células de outros organismos, inclusive para células humanas. Isso cria possibilidades biotecnológicas promissoras e soluciona os desafios enfrentados pelos cientistas que trabalham com organismos cuja manipulação genética é muito difícil.

Galhas e evolução
O significado evolutivo das galhas é motivo de debates. Originalmente foi sugerido que essas estruturas seriam utilizadas pelas plantas para isolar os danos dos galhadores. Contudo, o fato de estes parasitas se desenvolverem somente em galhas indica que eles devem se beneficiar dessa associação, recebendo um farto suprimento nutricional, proteção contra inimigos e um ambiente propício para seu desenvolvimento.

A presença de galhadores pode ser, pelo menos em alguns casos, benéfica para as plantas. Vespas que parasitam figueiras, por exemplo, beneficiam as plantas afetadas, pois as suas galhas apresentam modificações que facilitam a reprodução desses vegetais.

Porém, os prejuízos causados pelos galhadores pela destruição de tecidos saudáveis e pela competição com outros tecidos vegetais por recursos são mais evidentes. Além disso, as galhas podem enfraquecer as plantas hospedeiras, dificultando seu desenvolvimento e abrindo caminho para o atque de outras pragas.

Conhecidas em registros fósseis de mais de 300 milhões de anos, as galhas ocorrem em mais de 60% das famílias vegetais e são ainda pouco estudadas (com a exceção de pesquisadores como Geraldo Wilson Fernandes , professor da Universidade Federal de Minas Gerais – um dos maiores craques mundiais nessa área). Essas estruturas são um exemplo fascinante dos desafios científicos futuros que somente serão superados se formos capazes de trabalharmos na interface entre ecologia, biologia celular e molecular.

Jerry Carvalho Borges
Colunista da CH On-line
14/07/2006

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